“Não podemos acrescentar dias à nossa vida,
mas podemos acrescentar vida aos nossos dias”
Cora Coralina
Ouvir é bem mais que
escutar.
Algumas histórias
vividas nos vêm à lembrança quando alguém nos conta. Outras ficam em nossa
memória para sempre. E algumas se repetem ao longo da vida, em várias
circunstâncias, que a gente nem imagina. Mas todas elas servem para nos ensinar
alguma lição. E a vida, meu amigo, é feita de lições. Uns aprendem e outros nem
se dão conta disso.
Há muito tempo li em
um artigo científico que a gente escuta com a cabeça e não com os ouvidos.
Tenho que admitir, nunca tinha pensado sobre isso, mas é a mais pura verdade.
Vou tentar demonstrar isso contando três histórias que aconteceram comigo em ocasiões
diversas. E em todas elas eu não ouvi com a cabeça e, por isso, não entendi
nada o que escutava.
Na primeira eu tinha
apenas quatro anos de idade e já convivia com “gringos”. Eram americanos, amigos
de meu pai, que frequentavam a nossa casa. Alguns até se hospedavam conosco. E
eu não entendia nada que eles falavam. Um dia estava eu a brincar no meu
velocípede, no quintal de casa, quando avistei no portão um “gringo” chegando
para nos visitar. De longe eu percebi
que se tratava de um americano, e logo comecei a falar enrolado, imitando-o. Minha mãe ouvindo aquilo, olhou para o portão
e viu que tínhamos visita estrangeira. Ela morreu de rir da minha percepção
sobre a nacionalidade de nosso visitante.
Mas, o mais engraçado,
naquele dia, ocorreu na hora do almoço, quando nosso convidado me pediu para que
eu lhe ensinasse português. Ele apontava para os talheres à mesa e me perguntava
como se falava aquilo em português. Daí, eu cochichei para minha mãe e disse: -
mãe eu vou ensinar português errado pra ele. Ele não vai entender nada mesmo. Nesse dia eu aprendi que quando não sabemos
nada sobre um assunto, tudo que nos for contado a respeito vai parecer verdadeiro. Muito
importante essa lição!
Já na adolescência,
eu tinha 16 anos, e fui morar nos EUA com toda a minha família. Logo que cheguei
à casa que alugamos, eu liguei a televisão para assistir ao jornal local. E surpresa:
não entendi absolutamente nada! É que a velocidade da língua falada é muito
rápida, e quem não está acostumado não consegue entender mesmo. Eu já sabia um
pouco de inglês, pois sempre estudei em escolas particulares e, antes de nos
mudar, fiz um curso de conversação e achava que estava preparada para
entender qualquer coisa. Que ilusão! Não adianta saber inglês se o seu ouvido
não está acostumado com a velocidade da língua. Só com o tempo que a gente vai
treinando os ouvidos e entendendo alguma coisa. Aprendi com isso que, não
importa quem está falando, se quem está escutando não entende nada! Muito
importante essa segunda lição!
A última lição aconteceu
quando eu já era uma acadêmica de Direito. Já cursava o último ano do curso e
estava fazendo o estágio supervisionado que consistia em assistir audiências e
sessões de julgamento nos Tribunais Superiores. Um dia fui assistir a um
julgamento no Tribunal Superior do Trabalho e adivinhem o que aconteceu? Eu não
entendi absolutamente nada do que os Ministros estavam falando. Parecia que estavam
falando em outro idioma. É bom esclarecer aqui que a matéria tratada em
Tribunais Superiores é sempre de Direito, e, portanto, é preciso ter
conhecimento técnico-jurídico para entender. Nesse dia aprendi que se você não
tem conhecimento técnico sobre algo, é melhor nem escutar, pois, não vai entender
nada. Portanto, estude e aprimore seus conhecimentos técnicos sempre, pois;
isso vai fazer a diferença na sua profissão, seja ela qual for.
Hoje eu entendo que por
mais que eu estude sempre há mais alguma coisa a aprender. E que não basta escutar;
é preciso saber ouvir e entender o que se ouve. Enfim, ouvir é bem mais que
escutar.
Sylvana Machado
Ribeiro.
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